Na presente década, iniciada com a assunção de Lula
à presidência da República e o início da transição da ordem vigente a
um novo projeto de nação, a possibilidade de expressão da vontade
popular por meio de demonstrações de rua esteve relativamente
amortecida. O volume de novas conquistas sociais progressivas e o
crescimento econômico com expansão do emprego e valorização da massa
salarial e a concretização de inúmeras bandeiras reivindicatórias
alevantadas pelo movimento estudantil e outros segmentos condicionaram,
naturalmente, a mobilização de rua a alcance relativamente restrito.
Verdade que assalariados estiveram nas ruas muitas
vezes, liderados pelas centrais sindicais; estudantes universitários e
secundaristas, a convite da UNE, da UBES e entidades estaduais e
municipais; moradores das periferias urbanas, arregimentados pela Conam e
organizações de bairro e de luta pela moradia; trabalhadores rurais,
pelo MST e sindicatos, idem – pugnando por suas bandeiras específicas
articuladas com questões cruciais para o desenvolvimento do País, como a
política de juros e demais fundamentos da política macroeconômica.
Porém sem jamais atingirem o nível das mobilizações espontâneas
verificado nos últimos dias, que se espraiam por todo o País.
Tirante atitudes irresponsáveis de grupos
minoritários, a quase totalidade dos manifestantes expressa
democraticamente sua insatisfação em relação aos preços das tarifas dos
transportes urbanos e, de modo algo difuso, contra os elevados
investimentos na construção dos estádios de futebol para a Copa do
Mundo, espécie de senhas para outras reinvindicações, de cunho geral ou
local, que também vêm à tona.
Que assim seja, pois na medida em que o caráter
espontâneo e difuso do movimento dê lugar a um formato consciente e
direcionado poderá fixá-lo como elemento novo na cena política nacional –
fator de pressão pela aceleração das mudanças de maior envergadura,
rumo ao alargamento da democracia e de mais conquistas sociais. E,
assim, pesar decisivamente para uma assimetria favorável entre as forças
que efetivamente batalham por essas transformações no confronto com as
que resistem e desejam o retorno ao ultrapassado modelo de
financeirização da economia e de restrição de direitos.
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